quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Fernanda Lima e seu "Um passo a mais"


Esta entrevista foi concedida ao jornalista Wendel Lima e publicada na revista Conexão JÁ de abril/junho de 2011 e agora a divulgamos por aqui.

Porém, antes de ler a entrevista, permitam um breve comentário: O Wendel tem renovado muitos aspectos da revista jovem de nossa igreja e as mudanças vão muito além do novo nome (Conexão 2.0). Registramos aqui nossas congratulações pelo brilhantismo na editoria do periódico e, claro, não podia faltar o clamor: CONEXÃO MENSAL! CONEXÃO MENSAL!

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O passo mais importante

Fernanda Lima
http://umpassoamais.wordpress.com/
 Numa cadeira de rodas, ela aprendeu que a felicidade não depende das circunstâncias, mas do relacionamento que se tem com Deus. O testemunho de Fernanda Lima é um apelo para uma geração superficial

Eu nunca imaginei que um dia fosse entrevistá-la. Criados na mesma Igreja Adventista da Zona de Norte de São Paulo, minha amizade com a Fernanda Lima foi formada após seu trágico acidente, na véspera do Dia das Mães de 1998. Acidente que matou 14 jovens que voltavam de um congresso e que a colocou numa cadeira de rodas, aos 18 anos. Conheci poucas pessoas como a Fernanda, que fazem perguntas tão profundas quanto a experiência que procuram ter com Deus. 

Mas nem sempre foi assim. Como ela mesmo se define, até o acidente, era uma pessoa normal, leia-se espiritualmente superficial. Porém, após a tragédia, ela aprendeu que poder tem as simples, mas imprescindíveis decisões. Tornou-se atleta paraolímpica, ganhou medalhas de ouro na natação e bateu recordes. Mais do que isso, testemunhou sobre o sábado para nadadores e comissões técnicas. Terminou a faculdade, concluiu seu curso de inglês. Comprou carro, apartamento e aprendeu a morar sozinha. Tem testemunhado por todo o Brasil falando de sua experiência de superação e busca por Deus. Recentemente, contou sua história na obra Um Passo a Mais, lançado pela CPB, e que foi escolhido como o livro do ano de 2011 para os jovens. É sobre tudo isso que conversamos por telefone. Leia, porque você vai se identificar.

Conexão JA: No começo do teu livro, você declara algo que acho fantástico: seu único problema era ser normal. Esse é o problema dos cristãos hoje?
Fernanda Lima: Sem dúvida. Se eu falar só normal eu vou ser pouco específica. Eu acho que nosso problema é ser superficial. Faz parte da normalidade lidar com erros e acertos, mas o que nos marca é nossa superficialidade no relacionamento com Deus e com as pessoas. Nós vivemos numa situação estanque, mas como a vida é dinâmica, você não consegue ser assim por muito tempo. Por isso, eu sempre digo que uma vida superficial, uma hora ou outra, vai resultar num momento de crise. Ninguém consegue manter a aparência de normalidade.

Essa peculiaridade é mais forte em nossa geração?
Sim. Nosso acesso à informação aumentou muito e isso nos deixa extremamente ansiosos. O ritmo de vida, principalmente nas cidades grandes é muito intenso, muito rápido, e o vazio que o homem tem continua muito grande. Essa ânsia leva as pessoas a manter a mente ocupada, mas o coração vazio. Tudo porque para escolher com que preencher esse vazio é preciso parar.

Como nasceu a ideia do livro?
Era o pedido de muitas mães que ouviram meu testemunho. Elas queriam que os filhos e outros familiares também conhecessem minha história. Eu tentei escrever algo por duas vezes, mas não deu certo. Até que em 2009 decidi tentar de novo. Orei e em 30 dias o livro estava pronto.

Como os leitores têm reagido?
Apesar de eu não ter feito nenhum lançamento oficial, houve um movimento na internet, feito por amigos, para promovê-lo. Alguns sites institucionais e a Rede Novo Tempo também divulgaram. Daí surgiram vários convites para testemunhar e lançar o livro em igrejas de vários estados. Os leitores têm respondido também por e-mail e pelo Orkut. É muito bom ver que o livro serve como uma mola propulsora para a vida espiritual deles.

Em nosso tempo, as pessoas estão cansadas dos discursos protocolares e promocionais. Prezam mais por uma espiritualidade autêntica. Você acredita que esse pode ser um ponto forte de identificação com seu livro, que usa uma linguagem simples e direta como de um diário, ora temperada com humor, mas sempre autêntica?

Talvez, por não ser escritora e não ter muita consciência das técnicas, eu optei pela transparência. Eu sinto essa carência na literatura religiosa. Acho a linguagem muito engessada e já ouvi isso de outras pessoas também. Eu sou uma pessoa descontraída, por isso, o humor é algo natural no livro, como se estivesse conversando. Isso é mais importante ainda hoje, quando os cristãos estão perdendo o hábito de ler. Acho que além de uma linguagem mais informal, deveríamos usar a ficção, como é feito nos Estados Unidos.

Como ter uma vida significativa e reflexiva em meio à turbulência?
Fazendo boas escolhas. Deus é fantástico, porque ao mesmo tempo que Ele é muito complexo, também é simples. Dentro das 24 horas que Ele dá para todo mundo, se nós realmente quisermos, é possível priorizar a vida espiritual. Não precisamos dar uma chance para Deus, é preciso aproveitar as chances que Ele nos dá. A única forma de não sermos engolidos por esse sistema, é a boa e velha receita de começar o dia com Deus e de alguma forma, nos momentos livres durante o dia, manter comunhão com Ele, seja por meio de música, leitura ou que for. É preciso pedir para Deus nos ensinar a buscá-Lo, aí sim a frequência a igreja no fim de semana vai fazer algum sentido.

Você já testemunhou para milhares de pessoas no Maracanazinho. Como tem sido compartilhar sua história ao redor do Brasil?
Testemunhar sempre é um privilégio. Seja para 20 pessoas como num pequeno grupo ou para 12 mil pessoas como foi no Maracanazinho. Cada região do Brasil reage diferente, mas a gente percebe que a necessidade e a esperança são as mesmas. Percebo que minha experiência mexe com crianças até idosos. E a cada oportunidade em que testemunho, isso só fortalece minha fé.

O que foi pior no primeiro momento após o acidente? A dor, a perda dos movimentos ou a morte de conhecidos?
Foi a morte. Porque apesar de ter viajado com muitos desconhecidos, você nunca espera que, ao voltar de um congresso de jovens, 14 pessoas não retornem com você. Isso foi bem forte.

E você se revoltou contra Deus naquela época?
Não e em nenhum momento, porque justamente eu achava que minha recuperação era uma questão de tempo. E depois, quando fui tomando conhecimento do que realmente tinha acontecido comigo, eu passei a acreditar piamente no milagre. Para que eu ia chorar hoje se o milagre pode acontecer amanhã? No início, meu sentimento era de gratidão, porque se eu fosse a 15ª vítima, eu teria morrido perdida. Porém, depois de três anos, depois de muito pedir e nada acontecer, e concluir que Deus pode tudo, mas por alguma razão não havia me curado, aí doeu. Mas eu não me revoltei, me entristeci, porque não via perspectiva. Eu tinha 21 anos, ficava sozinha e não tinha vida acadêmica, profissional e social. Deu vontade de morrer não por revolta contra Deus, mas por falta de perspectivas.

Alguns acham que o sofrimento pode fazer milagres. As adversidades podem amolecer ou endurecer o coração?
Eu não quero aqui subestimar o papel do sofrimento na vida. A gente sabe da importância dele para o crescimento. No entanto, o mais importante é como o sofrimento é encarado. Conheci muitas pessoas que ficaram limitadas por causa de tragédias, e endureceram completamente o coração. O sofrimento pode ser uma bênção, mas não é ele e nem a alegria que muda a vida, mas o relacionamento com Deus.

Como a Igreja Adventista tem lidado com os portadores de necessidades especiais?
De forma geral não tem lidado. Temos uma legislação sobre acessibilidade que não é respeitada na maioria das igrejas. E o primeiro passo para alcançar os cadeirantes, é dar a eles o direito de ir e vir a igreja. Eu não fico constrangida de ser carregada, mas outras pessoas, principalmente os visitantes, talvez não tenham a mesma sensação. A igreja deveria ser o lugar mais acessível para todos.

Quais são alguns estereótipos dados aos cadeirantes?
A distância acaba fazendo o mito. Muitos infantilizam os portadores de deficiência, porque acreditam que eles são inferiores intelectualmente e profissionalmente. Por isso, muitos não conversam com o deficiente, mas se dirigem para quem o acompanha. Outro mito é de que os cadeirantes são assexuados e de que a deficiência transforma o caráter, como se não houvesse deficiente ladrão também. Além disso, o deficiente é associado ao feio, pobre e iletrado.

Quão independente um cadeirante pode ser?
A independência dele está muito ligada à acessibilidade das edificações. É preciso que ele se qualifique e trabalhe, para ter independência financeira, porque ter um carro, por exemplo, que facilita muitas as coisas, é preciso dinheiro. No meu caso, por influência da minha grande amiga Jaqueline, eu aprendi a adaptar, a fazer as mesmas coisas de maneira diferente. É verdade que tenho alguns profissionais que me ajudam, como uma faxineira e um personal trainner, mas consigo morar sem meus pais tranquilamente no meu apartamento.

Com o que você sonha?
Eu gostaria de trabalhar mais com voluntariado. Não sei como ainda, mas eu quero ajudar outros cadeirantes a acelerar seu processo de independência. Porque a vida continua muito boa, dependendo de quão independente você é.

E como surgiu a carreira de atleta?
Durante a minha reabilitação na AACD, um ano após o acidente, eu fui convidada a nadar. Comecei numa piscina pequena. Eu precisava fazer muito mais esforço para nadar, mas quando consegui dar braçadas sem ajuda de ninguém, aquilo foi literalmente um divisor de águas. Depois, passei a treinar em clubes e a competir em torneios nacionais. Mantive o melhor tempo do Brasil nos 50 metros borboleta durante os cinco anos em que nadei. Esse tempo era o décimo melhor do mundo e o quarto melhor das Américas. E cheguei a ser convocada para a seleção brasileira paraolímpica.

Qual é o paralelo do esporte com a vida cristã?
Eu vejo muitos. Primeiro, um atleta só é bem sucedido se tiver regularidade. Tem que treinar todos os dias, sem vontade ou com dor. O treino não faz cócegas, mas o atleta se submete a ele, porque tem uma meta. Outro paralelo é em relação a obedecer ao treinador. Ainda que você nem sempre concorde com o técnico, você não vai a lugar nenhum sem ele. Na vida cristã, é preciso pensar se queremos pagar o preço do treino, do esforço e das eventuais derrotas. Mas a recompensa é certa, porque o resultado sempre vem.

Como você testemunhou nesse ambiente esportivo?
Apesar de eu não ter competido aos sábados, tive excelentes resultados. Quando eu consegui o índice paraolímpico, veio a convocação para a seleção brasileira. Mas na hora de assinar o contrato, vi que havia uma cláusula sobre a disponibilidade para realizar as provas em qualquer dia. Fui falar com o coordenador técnico sobre a guarda do sábado e ele me disse que eu merecia estar na seleção. No entanto, era preciso que a comissão organizadora aprovasse minha participação com a abstinência às competições aos sábados. E para glória de Deus, fui aprovada por unanimidade.

Quais são as quatro grandes lições que você disse ter aprendido nos últimos 13 anos?
É verdade e eu termino meu livro com isso. A primeira é que Deus deseja ir sempre além de um relacionamento superficial conosco. E nesse aspecto, mais importante do que a velocidade com que se vive é ter a consciência de que direção vai nossa vida. A segunda lição é que Deus usa a leitura como um meio poderoso para mudar nossos hábitos e atitudes. A terceira, e mais importante delas para mim, é que a felicidade não depende de você estar na situação mais desejada. E a última é que não é preciso acontecer uma tragédia para mudar nossa experiência com Deus. Prova disso, é que alguns que passam por grandes provações abandonam a fé, ao invés de abraçá-la.

Qual é o objetivo social do seu livro?
Parte da renda com a venda dos livros, meus direitos autorais, serão revertidos para a compra de equipamentos para portadores de alguma deficiência que não tenham condições de adquiri-los. Graças a Deus, nos três primeiros meses foram vendidos mais de 3 mil exemplares do livro, um valor equivalente a duas cadeiras de rodas. Meu objetivo não é ajudar alguma instituição específica, mas fazer as doações pessoalmente. E para tornar a campanha mais transparente, eu criei um blog (http://umpassoamais.wordpress.com), no qual informo o quanto foi arrecadado e para quem foram destinados os recursos.

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